O possível impossível
A primeira vez que vi as escadas
planas de Arnaldo Bataglini penduradas na parede feito um desenho
traçado às pressas, com linhas concretas, em cobre
e latão, pensei imediatamente em Kafka e nas suas situações
paradoxais, impossíveis. Fui invadido por um estado de
graça incompreensível e apelos indizíveis.
Tive vontade de ser alçado às alturas, alucinei
um anjo no caminho. Mas também quis transpor a parede,
passar para o "lado de lá", e como Alice experimentar
um outro espaço, um outro tempo, um outro mundo.
Talvez porque as esculturas de parede sejam essa conjunção
de desenho no espaço e construção do espaço.
Como não ser atraído para dentro desta porta e
ao mesmo tempo expulso para fora dela? Que jogo de possível
e impossível se anuncia aí? Quiçá
para o artista a pergunta seja outra: como preservar na tridimensionalidade
a liberdade que oferece um plano, como se modula espacialmente
aquilo que foi pensado como desenho, como isto desmonta a ilusão
da perspectiva... Para mim, nestas linhas que se prolongam no
infinito a partir de uma malha de materialidade metálica,
com seus limites próprios, e através dos jogos
com o vazio que aí se liberam, há uma promessa
irrecusável, indefinida. Um convite sensorial. Uma ausência
de tempo.
Peter Pál Pelbart
São Paulo, março 2002 |